O aumento de queixas públicas por parte de franqueados tem levantado dúvidas sobre o modelo de franchising e o equilíbrio nos contratos entre franqueador e franqueado. Nos últimos meses, relatos nas redes sociais e na imprensa têm exposto conflitos com marcas de grande alcance, como a Cacau Show, onde ex-franqueados denunciam cobranças inesperadas, dificuldades para deixar a rede e pressão judicial após tentativas de contestação.
A maior parte dos contratos de franquia inclui cláusulas de arbitragem privada, mecanismo que impede o o ao Judiciário comum e obriga o franqueado a arcar com custos iniciais que podem ultraar os R$ 50 mil. Esses contratos costumam prever, ainda, pagamentos mensais à câmara arbitral enquanto o processo estiver em curso. Em meio a esse cenário, muitos optam por encerrar as operações sem litígio, mesmo com prejuízos financeiros relevantes.
O caso da Cacau Show exemplifica como o conflito pode escalar. Franqueados relataram o envio de mercadorias próximas do vencimento, a imposição de metas difíceis de cumprir e a intensificação de exigências contratuais após qualquer manifestação de insatisfação. Segundo um advogado que atua em diversos casos envolvendo a rede, há relatos de perseguição jurídica e uso do contrato para inviabilizar a operação, o que, segundo ele, força o franqueado a entregar o ponto em condições desfavoráveis.
Franqueados são movidos por promessas de dinheiro fácil, mas modelo de negócio exige muito trabalho
Apesar do aumento nas denúncias, muitos empreendedores seguem entrando no sistema com base em expectativas criadas por promessas de alta lucratividade e pela força da marca. A análise contratual, nesses casos, costuma ser negligenciada ou tratada como etapa protocolar. Especialistas apontam que o franqueado raramente questiona cláusulas restritivas antes da e, muitas vezes, subestima as limitações operacionais impostas pelo modelo.
Parte do problema está na assimetria de poder. A franqueadora dita as regras, controla a comunicação, o fornecimento de produtos e, em muitos casos, até a precificação. O franqueado assume os riscos da operação, mas tem pouco espaço para decisões locais. Quando surgem divergências, a tendência é que a empresa utilize os próprios dispositivos contratuais para pressionar o parceiro.
A crise entre franqueador e franqueado não é nova, mas ganha visibilidade à medida que mais empreendedores relatam suas experiências publicamente. O número crescente de ações judiciais e arbitrais sinaliza a necessidade de maior equilíbrio contratual e de uma análise mais crítica antes da entrada em redes de franquia.
Enquanto a adesão for feita com base em promessas e não em uma análise racional dos riscos e limites do contrato, novos conflitos continuarão a surgir. Até em franquias gigantes.